Representantes das comunidades Kaingang, Guarani e Xokleng, entidades parceiras e convidados/as debateram as realidades indígenas, o contexto geral do país e as emergências climáticas durante a 49ª Assembleia do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) Sul. O encontro aconteceu de 1º a 4 de agosto/2024 na Casa de Orações São João, em Porto Alegre (RS), e reuniu representantes do CIMI nos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e São Paulo para fazer um balanço de suas ações junto aos povos indígenas. Roseli Pereira Dias representou a Cáritas Regional RS na assembleia. “Destaco a presença e a força das mulheres indígenas presentes nesta assembleia, que com seus pés fincados no chão nos provocam à defesa intransigente dos povos indígenas e da mãe terra”, afirmou Roseli.
A Assembleia iniciou com uma análise de conjuntura. “A causa indígena é a mais importante da
sociedade brasileira, assim como a dívida com a escravidão”, disse Frei Sérgio
Görgen. Em sua fala, Frei Sérgio resgatou as diversas violências contra os
indígenas, por exemplo, para a implantação da colonização alemã no Rio Grande do
Sul, e reiterou sua admiração incondicional às ações do CIMI. Segundo o frei,
“estamos vivendo um modelo civilizatório que está acabando e que é
completamente diferente da visão dos indígenas”.
Ele salientou que a humanidade vive diversas
crises. Uma delas é a crise energética.
“Já chegamos ao pico de produção do petróleo, então está cada vez mais caro
explorar mais profundo, por isso as poucas empresas que controlam o petróleo no
mundo disputam novos recursos renováveis”, observou.
A crise ambiental, disse Frei Sérgio, é muito maior
que se imagina e a solução passa pela visão indígena e sua relação com a
natureza. Frei Sérgio também falou sobre outras três crises: a alimentar, na
qual destacou dificuldades futuras com a possível escassez de insumos, como
potássio e fósforo; a sanitária, com a saúde das pessoas cada vez mais
fragilizada, especialmente por causa dos venenos aplicados na produção de
alimentos e aumento dos casos de câncer, e, por fim, a crise geopolítica, sobre
a qual destacou que a “a força no mundo está sendo redistribuída e os Estados
Unidos já não mandam mais sozinhos”.
Frei Sérgio também defendeu a necessidade de espalhar a causa indígena
para que se reconheça a luta contra o marco temporal.
Luis Ventura Fernández. Secretário Executivo do Cimi,
trouxe para a assembleia informações da violência sobre os guaranis kaiowa, a
resistência forte dos indígenas e as perspectivas desta luta. Ressaltou o
crescimento da extrema direita no Poder Legislativo e destacou que, no plano
internacional, também é necessário construir uma análise a partir da realidade
dos povos indígenas de cada país.
Participando do diálogo sobre a conjuntura, Eloir Werá
Xondaro, da retomada Guarani Mbyá Nhe’engatu, em Viamão, disse que a luta dos
povos indígenas é por direitos e pela busca da terra sem males. “Nós, em
pequenas aldeias, ficamos enfraquecidos. Nos territórios, não buscamos só caça
e pesca, mas área para recuperar nossa cultura, nosso jeito de viver. As
retomadas são este movimento dos Mbya Guarani: aqui no RS são oito. Muda
partido, muda político, mas não muda a política... não respeitam a Constituição
Federal de 1988 e nossos direitos já escritos. O que nos mantém em pé é nossa
espiritualidade. A violência contra os indígenas jamais deveria acontecer. O
que vocês chamam de catástrofe nós chamamos de puxão de orelha de Anhanderu.
Aqui, das 68 terras, apenas oito são demarcadas pela União. Há muita
insegurança”. José Vergueiro, Kaingang, de São Leopoldo, completou a reflexão
defendendo a necessidade de conscientizar as pessoas sobre o que são as retomadas.
“Na nossa aldeia a gente cuida de uma fonte de água que nos salvou durante a
enchente quando faltou água”, observou.
Ao final da Assembleia foi divulgada uma
carta-mensagem aos povos Guarani e Kaiowá e ao CIMI Regional Mato Grosso do Sul,
que estão sofrendo ataques reiterados em seus territórios.
Mensagem da 49ª Assembleia do Cimi Sul aos queridos irmãos e queridas irmãs dos povos Guarani e Kaiowá e do Cimi Regional Mato Grosso do Sul
As dores provocadas pelas violências contra os povos indígenas são profundas e angustiantes
Revelam um contexto de negação à vida e à justiça
Revelam que criminosos - da política, do latifúndio e das forças de segurança - se associam para agredir e matar
Revelam a desumanização dos outros, das filhas e filhos da Terra Mãe, por aqueles que colonizam e escravizam
Revelam a covardia mais vil, tirana e brutal contra os corpos de crianças, adolescentes e jovens, vítimas preferenciais dos criminosos
Revelam também que precisamos juntar e organizar as forças - políticas, sociais, religiosas, jurídicas - que são solidárias aos povos indígenas
Revelam a necessidade de um grande mutirão de enfrentamento aos facínoras que agridem e violentam
Revelam que precisamos agir em redes articuladas com planos - projetos de lutas e resistências - que se agregam em defesa da Terra e dos direitos fundametais dos povos
Nós, missionárias e missionários do Cimi Sul, nos sentimos chamados a estar com vocês no Mato Grosso do Sul
Nos colocamos a disposição para nos somarmos a vocês, como irmãos e irmãs de caminhada, nesse tempo de tantos sofrimentos
Queridas irmãs e irmãos, aqui em nosso Regional Sul, temos vivido muitas dores, mas presenciamos muitos sinais de esperança e de fraternidade
As retomadas de terras que se consolidam, geram alegria e são sementes de sonhos e vidas que se multiplicam
Revelam que a Terra Sem Mal, o Bem Viver dos Povos, fermentam os caminhos, dão direção e alimentam as esperanças
Cremos que, apesar das lágrimas de sofrimentos, apesar do sangue derramado, apesar das incertezas de hoje, o amanhã será melhor
Recebam nosso abraço, nosso carinho, nossa solidariedade e nosso apoio, porque estamos juntos como nossos corações e preces
Contem conosco e digam ao Povo que avance:
AVANÇAREMOS!