Representantes das Cáritas Arqui/diocesanas do Rio Grande do Sul se reuniram nos dias 13 e 14 de março de 2024 na Casa de Oração São João da Cruz, em Porto Alegre (RS) para participar do Fórum de Planejamento, Monitoramento, Avaliação e Sistematização (PMAS) 2024/1. Foram dois dias de reflexões, místicas e relatos de experiências e vivências, que vão contribuir para reforçar e ampliar as ações da Rede Cáritas RS nos próximos meses. Houve partilhas e encaminhamentos sobre as Assembleias Nacional e Estadual da rede, sobre eleições de diretorias; sobre o próximo Inter-Regional Sul, que será no Paraná, além da comunicação, sustentabilidade e cronograma anual.
As místicas contribuíram para inspirar e unir o grupo. Durante o encontro, o Padre Leonardo Dall’Osto, de Caxias do Sul, aprofundou o tema da Campanha da Fraternidade, cujo tema é Fraternidade e Amizade Social e o lema “Sois todos irmãos e irmãs”. Fazendo interface com elementos da realidade, Padre Leonardo falou sobre conversão, sinodalidade e amizade social.
Estes são alguns destaques de sua análise:
“Conversão significa mudança de mentalidade, de pensamento. Fomos formados/as com a ideia de conversão como voltar-se para Deus. No Evangelho, aparece como voltar-se para onde Deus está voltado. Não basta olhar para Jesus e não aprender a olhar como o Mestre olha. Olhamos para ele para aprender com ele o olhar da realidade.
Conversão é olhar para a pessoa, para a realidade, como Ele olhava/olha. É trabalho que temos que refazer também nas comunidades, mas como Cáritas e Pastorais Sociais.
Quaresma = período de Conversão
Conversão é como mudamos de mentalidade para assumirmos o ponto de vista de Jesus e como Ele olha. Não somos convidados em Jesus a irmos para Deus, mas irmos COM ELE, aonde Ele vai.
Na Campanha da Fraternidade e Quaresma, a conversão possui uma dimensão comunitária, pois não existe a relação com Deus que não seja medida pela relação com os irmãos e as irmãs. Até mesmo quando adoramos Deus na Eucaristia.
Temos na mente um Deus que quer ser servido. Jesus veio para servir.
Na Quinta-feira Santa, no texto do Lava-pés de São João, Jesus diz: vocês me chamam Mestre e Senhor, mas se eu, Mestre e Senhor, lavei vossos pés, lavem os pés uns dos outros.
Em nenhum momento do Evangelho Jesus pede que o adoremos. Ele pede que cuidemos dos irmãos, porque é a continuidade do que ele fez.
Papa Francisco e a Amizade Social
O tema da Amizade Social não é invenção da CNBB. Está no documento Fratelli Tutti, escrito praticamente durante a Pandemia (de Covid-19). Ou nós entendemos que, como humanidade, somos todos irmãos/irmãs, ou cairemos todos no buraco.
Aí vem a expressão da Amizade Social, ideia segundo a qual temos que romper barreiras de vínculos de família, igreja, fraternidade, porque todos e todas somos irmãos/irmãs.
A gente sabe – todos somos irmãos e irmãs -, mas a riqueza está nas mãos de quantas pessoas? Será que todas as pessoas católicas entendem?
Quanto tempo demora para derrubar a lógica do racismo estrutural?
A Amizade Social, na visão do Papa Francisco, é a incidência prática do que dizemos na teoria. Temos que promover a fraternidade vivida. Não é apenas um discurso. É criar dispositivos para ter vínculos práticos de fraternidade com irmãos e irmãs.
Como fazer para alargar esses vínculos? Esse é o desafio da Amizade Social.
O conceito de Amizade Social é amor que ultrapassa barreiras de amizade restrita por língua, religião, cultura. É maior, exige repensar uma estrutura sócio-política.
Antes se dizia que fora da Igreja não há salvação. Até o Concílio Vaticano II, nosso amor era restrito aos Católicos. Se eu condicionar a salvação a um signo eclesiástico, meu amor fica restrito. O Concilio Vaticano II derruba a questão do mérito, que estava em disputa.
Sugiro trocar salvação por “comunhão” - com Deus e com os irmãos e as irmãs. Se salvação é comunhão, não é algo para depois da morte, é para hoje. A salvação acontece com os vínculos entre nós. Vivemos num mundo estressado, adoecido. É o (a) outro (a) que me diz que sou gente. Isso é fundamental para nós, humanos.
O Papa Francisco várias vezes fala em sonhar. Quando ele fala com jovens, fala em sonhar. Sonho é ideal ou é utopia? O termo Utopia provavelmente surgiu com Thomas Moore, no século 16. Utopia pode ser o “não lugar” (inalcançável) ou o “bom lugar” (o lugar que podemos atingir). Neste sentido, não podemos viver sós.
O Papa Francisco menciona a ideia positiva da Utopia. Diz que podemos construir um mundo diferente. Não esperar que caia do céu, ou só ter a esperança da eternidade. Precisamos dar passos para que o Reino de Deus possa ir alargando suas fronteiras. Não só ter a esperança da escatologia.
A Campanha da Fraternidade tem como objetivo geral despertar para o valor e a beleza da fraternidade humana. Despertar porque cremos que a fraternidade como valor já existe, mas está adormecida.
Ser irmão é uma realidade ou utopia? Em nível de fé, é realidade. Em nível prático, é utopia. Portanto, há uma dicotomia entre o que anuncio e o que eu vivo. Adianta dizer que somos todos irmãos e irmãs, se tem gente passando fome? É mais um desafio do que uma realidade. É ainda algo a ser construído como um bom lugar, não como um lugar inalcançável.
Frase: Onde está teu irmão? (Gn 4,9)
É a frase de um Deus não indiferente à sorte de um ser humano. Diante de um ser humano indiferente a seu irmão.
A ideia da imparcialidade de Deus é ideológica. Um Deus imparcial gera uma igreja imparcial. Mas Deus escolhe, e se põe ao lado.
Quando a igreja, na América Latina, formulou o princípio da opção preferencial pelos pobres, esta opção é de parcialidade de Deus.
Deus indiferente...estas questões são nossas, são humanas.
Vivemos numa sociedade plural, em que somos todos diferentes, com traços sociais, culturais, étnicos, religiosos, raciais, de orientação sexual e de pensamentos distintos. Essa realidade deve ser entendida como uma riqueza e não como um motivo para fazer com que nos tornemos oponentes.
Uma sociedade plural é uma sociedade saudável.
O outro é diferente, nem melhor, nem pior. A ideia da diferença é como salvamos.
Somos chamados promotores da religião. Mas somos, isso sim, promotores do Evangelho, porque o Evangelho prevê o respeito às diferenças.
O que o Papa Francisco chama a atenção é para a tentativa de construção de laços que ultrapassem as barreiras geográficas nas microrrelações de família, de amizade. É um desafio que contém nas mãos o futuro da humanidade. Ter capacidade de caminhar juntos. A Amizade Social é a tentativa de evitar a autodestruição a partir da fraternidade”.